Olhar

3 curtas no LGBTFLIX

A plataforma de streaming LGBTFLIX é uma das melhores coisas que surgiram por conta da pandemia. Criada pelo coletivo #VOTELGBT, a plataforma tem como objetivo atenuar a sensação de isolamento que muitas pessoas LGBTQIA+ já sentem normalmente no dia a dia, e que foi acentuada pelo estado atual das coisas.

Contando com mais de 220 filmes em seu catálogo (brasileiros, em sua maioria), a plataforma é um ótimo panorama da imensa quantidade de curtas-metragens feitos sobre o tema nos últimos anos, demonstrando a força e a importância desse formato para produções geralmente menores e mais experimentais, sem o dinheiro de grande produções.

Ainda não vi todos os filmes disponíveis, mas indico aqui 3 produções que conversaram comigo em níveis distintos, e tenho certeza que também irão conversar com vocês.

 

Primavera de Fernanda (Estevan de la Fuente e Débora Zanatta, 2018)

Logo nos primeiros segundos de Primavera de Fernanda, testemunhamos uma mulher sendo agredida por um homem, e rebatendo essa agressão com igual violência. No país onde mais se mata mulheres trans no mundo, até que ponto a violência não é simplesmente auto-defesa? Quantas delas sequer tiveram chance de se defender?

A partir dessa cena, acompanhamos Fernanda, que volta para casa com o rosto marcado, e escuta um “de novo?” de sua irmã claramente preocupada.

Esse desconforto, esse medo constante de talvez não sobreviver na próxima, é fruto da exclusão do corpo trans dos espaços escolares e de trabalho, marginalizando-o e limitando suas possibilidades de crescer dentro de uma estrutura escandalosamente preconceituosa.

Apesar do medo de ser rejeitada mais uma vez ao procurar um emprego, Fernanda resolve tentar novamente, sabendo que sua vida será repleta de nãos e portas fechadas, mas que alguns pontos de luz espalhados aqui e ali podem manter vivo um fiapo de esperança em tempos tão escuros. O apoio e encorajamento dessa irmã é quase um holofote.

 

Reforma (Fábio Leal, 2018)

Mesmo com todo o papo de corpos diversos, o universo gay ainda idolatra o padrão do homem Calvin Klein: barriga tanquinho e sem pêlos. Esse tipo de idealização e fetichização do corpo considerado ideal é razão da infelicidade de Francisco, interpretado pelo também diretor Fábio Leal.

Essa busca pelo corpo “perfeito” não afeta só a relação que temos com o nosso corpo, mas também o corpo que buscamos no outro. É como se não fosse possível sentir atração por um corpo que não seja aquele que nos vendem como sendo o ideal, o saudável, o sexualmente desejável, o corpo Smart Fit.

Esse descontentamento de Francisco é compartilhado com sua amiga Flávia, que está reformando o apartamento, e o desafia a mudar de hábitos para ter um corpo mais “desejável”. A partir daí, a verdadeira reforma parte da cabeça do próprio Francisco e do seu processo de auto-aceitação banhado a Caetano Veloso, Häagen-Dazs e muito sexo.

 

Netuno (Daniel Nolasco, 2017)

Os filmes do diretor Daniel Nolasco geralmente tratam de fetiches do homem gay e dos espaços comumente frequentados por esses homens: baladas, banheiros, vestiários e o recorrente “matinho” que toda cidade que se preze tem.

Nascido em Catalão, no interior de Goiás, Daniel se mudou para o Rio na época da faculdade e ficou intrigado com a curiosidade das pessoas referente ao seu ser gay em uma cidade do interior, como se esse “tipo de coisa” só acontecesse nos grandes centros urbanos.

Da mesma forma que retratou em seu último filme, o ainda inédito Vento Seco, o diretor traz em Netuno a atração de um homem mais velho por um garoto sarado padrão, misturando sonho e realidade para tentar entender as origens do que vou chamar carinhosamente de desejo, mas que beira a obsessão. Essa dinâmica entre personagens enrustidos e desejos reprimidos também me faz pensar nos filmes do argentino Marco Berger e nos ambientes carregados de suor e testosterona que o cinema gay adora retratar.

O curta é a última parte de uma trilogia que começou com Urano (2013) e seguiu com Plutão (2015). Esse último também está disponível na plataforma.

No mais, se cuidem, fiquem em casa sempre que possível e assistam mais filmes brasileiros.

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