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John Carpenter e o cinema de gênero

John Carpenter é um diretor de gênero. Todos os seus filmes habitam universos que permeiam o terror, a ficção científica, o suspense e a aventura, muitas vezes misturando vários deles e ganhando uma legião de fãs no processo. 

Geralmente trabalhando com orçamentos pequenos, seu cinema é marcado por um alto grau de criatividade e inventividade, sendo um dos mais importantes diretores do cinema independente norte-americano. A pouca grana também fez com que Carpenter trabalhasse não só como diretor, mas também roteirizando, produzindo, editando, compondo e atuando em diversos filmes. Em 2010 ele lançou Aterrorizada, seu último filme até o momento, e desde então se concentrou mais em sua carreira como músico.

Mesmo tendo dirigido mais de 20 filmes ao longo de sua carreira, poucos deles estão disponíveis atualmente nas plataformas de streaming e VOD, mas indico aqui quatro produções essenciais desse mestre do cinema de gênero.

Halloween: A Noite do Terror (Halloween, 1978)                                 
Disponível no Prime Video, Looke, Net Movies e Starz Play

Não existe muita coisa a se dizer sobre Halloween que já não tenha sido dita milhares de vezes antes, principalmente que ele é um dos filmes mais influentes da história do cinema e também uma das bases do gênero de terror slasher nos Estados Unidos, no qual um assassino persegue e mata um grupo de jovens com características pré-estabelecidas: a heroína inocente, a amiga mais extrovertida, os garotos que só pensam em sexo, etc.

O filme já começa com uma sequência memorável, onde acompanhamos o primeiro crime de Michael Myers quando ainda era criança, e a partir daí o diretor é muito hábil em criar uma atmosfera de constante tensão sem nunca tentar explicar as origens do mal que impulsiona o assassino.

Se você ainda não viu nada do John Carpenter, comece por esse filme.

O Enigma de Outro Mundo (The Thing, 1982)                                      ,
Disponível no Claro Video, iTunes e Looke

1982 foi um ano emblemático para o cinema de ficção científica, com o lançamento de grandes sucessos como E.T.: O Extraterrestre  e de filmes que tiveram uma recepção morna tanto do público como da crítica, como é o caso de O Enigma de Outro Mundo e Blade Runner, mas que com o passar do tempo ganharam reconhecimento e alcançaram o status de filmes cult.

Muitos atribuem esse fracasso ao próprio lançamento de E.T, justificando que o filme era muito assustador e pessimista para uma audiência que abraçou com tanto carinho e dinheiro um alienígena que queria telefonar para casa e andar de bicicleta com a lua ao fundo.

John Carpenter dá o tom do filme logo no começo, quando acompanhamos um helicóptero perseguindo um cachorro em plena Antártida ao som de sintetizadores sinistros, uma contribuição da excelente trilha sonora composta pelo mestre Ennio Morricone, falecido no começo da semana. A perseguição termina quando o cachorro chega numa base de pesquisas estadunidense, deixando os 12 homens que ali trabalham intrigados. Perguntas do tipo “por que estavam perseguindo um cão?” incitam um estado de tensão que só aumenta quando as respostas começam a aparecer. Na verdade, o animal é uma espécie de alienígena que consegue infectar suas vítimas com a mesma facilidade de um vírus, assumindo com perfeição suas identidades.

Uma das qualidades de um grande clássico é conseguir manter seus temas principais relevantes mesmo com o passar dos anos. Filmes são um reflexo do momento e contexto em que foram feitos, mas continuar reverberando mesmo depois de quase 40 anos de seu lançamento é algo que poucos filmes conseguem.

1981 é considerado como o ano do início da epidemia de AIDS nos EUA, apesar de hoje sabermos que o vírus já circulava o mundo anos antes, e ter como vilão uma criatura que pode ser “transmitida” e que contamina as células de sua vítima é uma alegoria pronta. Muito provavelmente Carpenter não tinha a intenção de fazer uma metáfora sobre o ocorrido, mas de alguma forma ele capturou muito bem o clima de medo, paranoia e falta de confiança daquele período.

Christine, O Carro Assassino (Christine, 1983)                                     
Disponível no HBO Go, Google Play e iTunes

Depois do fracasso de seu filme anterior, Carpenter optou por uma aposta mais certeira: adaptar um livro de Stephen King. O autor estava tão em alta na época que a produção do filme começou antes mesmo de o livro ser publicado. Apenas em 1983 um total de 3 filmes baseados na obra de King foram lançados: Chistine, Cujo e Na Hora da Zona Morta.

Lembro de o filme ser reprisado horrores no Cinema em Casa do SBT, mas revê-lo tantos anos depois me fez apreciar a experiência de uma maneira muito especial, com outros olhos.

Para quem não conhece a história, Arnie é um adolescente nada popular que está terminando o ensino médio e que numa tarde de verão se depara com Christine, um carro modelo Plymouth Fury 1957, vermelho e branco, e se apaixona por ela. Quando eu digo que ele se apaixona, não é apenas uma forma de dizer que ele gostou do carro, mas sim que ele começa a criar laços mais profundos mesmo.

Apesar dessa história aparentemente simples, podemos interpretar o filme como um atestado à fragilidade da masculinidade e como ela costuma se manifestar. Arnie é um perfeito estereótipo de nerd em filmes desse gênero: oprimido pela mãe controladora, poucos amigos, nada popular com as garotas, etc, etc, etc. Seu encontro com Christine o transforma, o deixa “mais forte” para enfrentar os anos de bully que ele enfrentou. A principio até torcemos por ele, mas a medida que Arnie se transforma e se assemelha cada vez mais às pessoas que sempre o hostilizaram, nossa simpatia diminui.

Já no começo do filme, quando vemos Christine na linha de montagem, John Carpenter é hábil em destaca-la no meio de todos os outros automóveis e mostrar sua natureza sinistra e não muito amigável. O diretor também consegue dar extrema personalidade ao carro, que liga seu rádio quando quer e escolhe músicas irônicas para momentos específicos, mostrando um senso de humor impecável. Vale apontar os excelentes efeitos visuais que “dão vida” à Christine e que seguem impressionantes até hoje.

Eles Vivem (They Live, 1988)                                                                     
Disponível na Netflix

Quase no finalzinho dos anos 80, John Carpenter aparece com essa que é uma de suas obras mais cultuadas até hoje, além de trazer um contexto que segue atualíssimo. No filme, acompanhamos um homem comum que passa por dificuldades e que um belo dia encontra uns óculos escuros dando sopa. O que ele faz? Coloca os tais óculos e percebe que o mundo em que vivemos é controlado por alienígenas com cara de caveira e que todos os cargos importantes são ocupados por eles, fazendo de nós meros escravos do consumismo e da obediência incontestável. Eles vivem sim, e nos controlam através de mensagens subliminares espalhadas por todos os cantos, telas, placas e frequências sonoras.

Aproveita que está na Netflix e assista hoje mesmo!

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